10 de outubro de 2009

18 INCOMPLETOS

eu não fazia nem sabia nada, só sabia dar nó sem gravata, correr praias, quebrar meus ossos, colher flores, cair de bolsa e tudo na água e deixar para lá, documentos boiando nunca me deixaram em paz por causa desse maldito dia, andava solta, fazia faculdade de filosofia e estágio na FAU e seguia por aí dando grande valor ao pensamento, até o dia em que disseram que a democracia havia chegado ao poder eu fui me unir a uma tropa que parecia que era de resistência invadindo um palácio para nele construir a opção da esquerda, ledo engano, era tudo só para eles mesmos, demorei uns vinte e poucos nisso e alí perdi minha liberdade, tentei os sindicatos, a tese, fui para universidade, tomava café com o Marcelo Rubens Paiva e adorava bibliografias extensas, me uní à causa das mulheres , quem sabe? deveria haver uma praxis para uma jovem (agora) socióloga que não queria ser teórica, entre as feministas impedí muita discriminação, ensinei o que era abuso para quem achava aquilo natural da vida, publiquei , viajei, foi legal, entre elas conheci lendas vivas, gente que era citada em livros que estudei e os próprios autores, trabalhei com gente que teve o corpo torturado e que era linda e eu gostava e que anos depois no poder tentou me torturar pela alma, praticando uma imunda coisa chamada jogo de influência, jogo do poder, fui receber a Flavia Shilling no aeroporto, depois me dediquei às crianças, as olarias, ao risco no trabalho, à loucura no trabalho, à consciência operária, alienação, fiz finalmente a tese, eu queria ela e não o titulo, em vez dele ganhei uma filha, amei a euritmia, o ser e o nada, sempre uma maneira de transformar, pela arte, pela politica, pela cultura, eu trabalhei muito, ganhei muito pouco dinheiro, até hoje não ganho, fui defender a minha própria causa e nela defendo a das minhas costureiras que admiro tanto, dando de dez agora em não ganhar nada messsmo, eu só dou duro, eu não ligo mais, nunca acertei nas minhas escolhas, sempre fiz a compra errada, perdí o horário do trem, comprei primeira classe sem querer e fiquei sem grana, mas cheguei sempre no destino, atravessei o mundo por um olhar, consegui criar uma mulher, escrever muito, ler sempre e ouvir muita música, amo as pessoas de trinta anos atrás porque elas me fazem feliz agora...51 semana que vem! nossa! quanta idade, me sinto como digo sempre com 18 anos incompletos, tá acabando meu inferno astral, dizem essa bobagem, será?não importa, sendo inferno é bom que acabe mesmo...!